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terça-feira, 27 de abril de 2010

MUDANÇAS CLIMÁTICAS E MEIOS DE COMUNICAÇÃO

O impacto das atividades humanas sobre o ambiente natural, objeto de estudo das ciências naturais, que buscam soluções para problemas como a poluição do ar e da água, desmatamento, erosão dos solos, perda da biodiversidade e a desertificação, afeta o equilíbrio ecológico do planeta. A pesquisa “Análise da desertificação nos sertões dos Inhamuns – Ceará, no contexto das políticas públicas e o papel da mídia” tem sua área de concentração em Tauá, município aprovado pelo Unicef por suas ações em favor do meio ambiente. A contextualização histórico-geográfica e científico-cultural das políticas socioambientais, o problema na história, na música e na literatura e nas notícias veiculadas nos jornais “O Povo” e “Diário do Nordeste”, entre 1992 e 2002, a avaliação do nível de informação da população de Tauá, o comprometimento e o conhecimento dos jornalistas sobre a temática ambiental são abordados neste trabalho. A desertificação é um obstáculo para o convívio no sertão, locus de políticas públicas emergenciais, prometidas em campanhas e anunciadas pela mídia, nunca chegam de forma efetiva, representando também ameaça ao desenvolvimento socioeconômico do Estado. Faz-se necessária, portanto, a adoção pelo Poder Público de processo de educação geral sistemática e de ecologia humana, em todos os níveis, para se poder reverter o quadro de ameaça e os níveis de pobreza e miséria da população sertaneja. Ademais, é necessário melhorar a formação do jornalista para que a cobertura dos temas ambientais saia do factual para o acompanhamento do processo. Agora não basta apenas reciclar e reutilizar, é necessária a mais profunda mudança de paradigma no sistema de produção e de consumo.

ANÁLISE DAS ENTREVISTAS COM OS JORNALISTAS

Os jornalistas cearenses consideram que a abordagem da questão ambiental na mídia local e nacional é insuficiente e ruim. As opiniões foram colhidas em entrevistas diretas nas redações dos jornais O Povo e Diário do Nordeste e são variadas. Algumas indicam uma acentuada falta de capacitação dos jornalistas para escrever ou falar sobre o meio ambiente e sobre as questões relativas nos veículos de comunicação em que atuam. Outras dizem que o tratamento do tema está, em geral, ligado a fatos, eventos, seminários, publicações, declarações, denúncias e não há continuidade. A cobertura ambiental acontece em forma de “movimentos pendulares” já que os jornais tratam a temática dentro da factualidade.

Os editores tendem a olhar a questão como sendo de outras editorias. Quando escrevem sobre meio ambiente nas respectivas editorias, os jornalistas limitam-se à abordagem parcial. A editoria de política só fala de depoimentos de políticos, sem qualquer aprofundamento ou comentário. Já a editoria de economia somente trata da pauta ambiental no caso de envolvimento de grande empresa ou se houver impacto econômico considerável. A editoria de cidade, por sua vez, só se interessa por eventos relativos ao tema. De um lado, existe acentuada “dificuldade”, por parte dos jornalistas, “de ver o que acontece fora da redação”; de outro lado, por parte da Academia, existe a “dificuldade de comunicar para a sociedade os resultados das pesquisas e trabalhos” e de participar na solução do processo. E mais, se o assunto colocar algum dos sócios da empresa ou grandes colaboradores (publicidade) em situação embaraçosa, o tema simplesmente não é tratado, sai da pauta imediatamente.

Há os condicionamentos econômicos inerentes à própria situação da empresa, que se aliam àqueles ligados às novas tecnologias, permitindo que, cada vez mais, todos tenham acesso ao maior número de informações de forma quase simultânea. Os jornalistas do O Povo e do Diário do Nordeste opinam que a inclusão de notícia sobre tema ambiental na pauta dos jornais acontece quando existem:

• Fatos (protestos, declarações, empresas prejudicadas, seminários) sobre o tema;
• Interesse pessoal: repórter traz temas relacionados ao meio ambiente para a reunião de pauta;
• Denúncias de fontes ou organizações.

Os jornalistas entrevistados consideram também que a contribuição dos jornais para ampliar o debate na sociedade sobre a temática ambiental é reduzida e limitada porque:

• Faltam conhecimento e preparação dos jornalistas para tratar o tema;
• Pouca gente lê jornal;
• O jornal dificilmente chega ao homem do campo, é lido só na cidade;
• Há uma avalanche de informações a serem tratadas pelos repórteres no dia-a-dia.

Para ampliar o debate e tornar a cobertura sobre meio ambiente na mídia mais efetiva e eficaz, os jornalistas que responderam à pesquisa sugerem:

• Melhorar o conhecimento dos jornalistas sobre a temática ambiental;
• Ouvir movimentos – ONGs, Associações, Sindicatos, especialistas etc.;
• Aproximar a Redação dos jornais às universidades;
• Não compartimentar a cobertura jornalística;
• Mudança de cultura e paradigma: da cobertura factual para o acompanhamento do processo.

As avaliações dos jornalistas sobre a cobertura ambiental nos jornais “O Povo” e “Diário do Nordeste” levam em consideração a factualidade, a fragmentação da Redação dos jornais em compartimentos específicos para cuidar de uma só temática, o encastelamento dos jornalistas e dos pesquisadores na Academia, a influência do poder econômico e político e até a falta de preparo específico do profissional da imprensa para lidar com o tema ambiental (Figura 1).

Avaliações dos jornalistas (O Povo e Diário do Nordeste) sobre coberturas nos veículos

FACTUALIDADE

”Encontro de desertificação, sim, é importante, dali você vai tirar outras coisas, mas você não sai dessa história, da factualidade”.

“É a cultura de mídia que temos. Essa coisa dos temas que voltam à pauta conforme o período; tem a questão da sazonalidade e da factualidade”.

COMPARTIMENTO

“Quando existem eventos na cidade que dizem respeito ao tema (encontros, seminários ou discussões) nós da Editoria de Cidade cobrimos porque o Caderno Regional, que geralmente trata dessa temática, fecha mais cedo”.

“Na área de negócios a gente só trata do assunto quando ele tem uma implicação financeira, quando o impacto ambiental influencia nos negócios”.

ENCASTELAMENTO

“Acho que deveria vir mais para a pauta, mas vem, vai e volta, o jornalista de qualquer Redação está encastelado, ninguém sai”.

“Nós que comandamos a Redação, cada um no seu núcleo, temos dificuldade de enxergar determinadas coisas porque somos presos às atividades internas”.

“A Universidade tem que deixar de pensar que jornalista não sabe escrever sobre temas que ela pesquisa. O jornalista não é obrigado a dominar conceitos, {...} ele deve dizer que a desertificação é palpável, que ela está no seu quintal, se você não parar de tirar o imbuzeiro, o pau santo, você vai começar um processo sem volta”.

INFLUÊNCIA DO PODER ECONOMICO

“Normalmente quem agride o meio ambiente são os grandes empresários, que, muitas vezes, são anunciantes do jornal, daí fica complicado. Isso limita. Qualquer jornalismo é limitado pela questão econômica, política e dinheiro”.

FALTA DE PREPARO E CONHECIMENTO DOS JORNALISTAS

“Não há repercussão. É como se as pessoas lessem e pensassem: isso não é comigo. É preciso melhorar a forma como é abordado, falta conhecimento ao jornalista para tratar o tema”.

“O meio jornalístico não está preparado. Não há consistência, nem se dá seguimento, é eventual, quando surge uma denúncia”.

“O meio jornalístico não está preparado para cuidar desse assunto. A gente sente até no meio acadêmico a falta de estrutura sólida com relação a esses questionamentos; são pontuais”.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESTUDO

Neste estudo, ficou demonstrado que Tauá é o município mais citado no período de 1992-2002 nas reportagens dos jornais “O Povo” e “Diário do Nordeste” sobre seca e desertificação e também que, apesar da relevância do tema para o Ceará, a maioria das matérias são factuais e dependem muito da disponibilidade de agendamento do meio de comunicação, pois acontecem apenas quando há seca declarada, encontros e estudos sobre seca, saques e datas comemorativas. Está claro, ainda, pelo que ficou demonstrado na variação de índices de desertificação divulgados pelos jornais pesquisados, que a cobertura do tema na imprensa local também leva à imprecisão, á confusão e desinformação da população. Os próprios jornalistas entrevistados reconhecem nas redações que eles são levados pela factualidade no agendamento das matérias. Para melhorar a qualidade da cobertura jornalística recomenda-se fazer uma ponte entre as redações e as universidades, quebrando o encastelamento dessas instituições, melhorando o nível de conhecimento dos jornalistas, o que poderia ser feito desde o seu período de formação. Esta aproximação entre a Academia e a Redação dos jornais poderia fazer com que a população tomasse conhecimento e entendesse melhor os estudos realizados sobre o tema na Universidade e também conhecesse as políticas públicas para a região. Afinal, a mídia, a Academia, a população, todos são responsáveis no processo. De nada adiantam os 1.369 artigos / reportagens sobre seca / desertificação publicados no período de 1992 a 2002, que continuam sendo publicados atualmente, se a população não toma conhecimento. Pouco vale o estudo ou pesquisa acadêmica se os governantes não aplicam o conhecimento na elaboração de suas políticas públicas.

Verifica-se, ademais, que seca e estiagem transformam-se em matérias dos jornais e são os temas mais explorados pelos políticos durante as campanhas eleitorais e eleitoreiras, que o tema da seca ajuda a todos, mas não se resolvem os problemas do homem sertanejo, agravados pela problemática da desertificação, que, aliás, é um obstáculo para o convívio no sertão e uma constante ameaça ao desenvolvimento socioeconômico do Estado. Recomenda-se, portanto, também, diante deste quadro de avassaladora realidade desta nação nordestina, que o poder público adote um processo de educação sistemática de ecologia humana, em todos os níveis de ensino, para se poder reverter o quadro de ameaça e o nível de pobreza e miséria da população.

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